Naquela semana, o sol de outono já carregava as cores do inverno.
Seguia achando graça no trânsito e no atraso contínuo do trem que seguia até a capital.
Não era um dia como os outros, sentia-se estranha, com aquelas sensações tão incomuns.
Sete da manhã, não acreditou no cachorrinho branco e preto que corria no mesmo sentido dos pedestres, que ia atrás do fusca branco, numa velocidade impensada. E o latido anunciava, “A correria de vocês aí é insana, o que estiver para acontecer, virá em sua direção”. Acelerava os passos na companhia de mensagens criadas ao acaso, coisa de filme, de livro de auto-ajuda, cheio de frases prontas, cartazes e letreiros em sua cabeça. Só faltava uma borboleta cruzar no seu caminho. E não é que apareceu mesmo? Era o azul da calça jeans que ela vestia. Assustada com aquela aparição, quase tropeça e solta um sorriso enorme, em plena segundona. Quem a olhava tão feliz não entendia nada.
Após almoçar no Centro da cidade, tomava seu café feito com capricho de barista pelo atendente.
O moço que sempre a observava no balcão estava lá, e se aproximou com uma conversa diferente das outras vezes.
-Boa tarde! Disse o rapaz.
-Qual seu nome mesmo? Perguntou com a inocência de costume ao moço que parecia, até então, ser comprometido.
-Meu nome combina com o seu! Soltando a cantada mais criativa que ouvira até então, pois seus nomes eram de fato um pouco parecidos.
Após a conversa, seguiram a tomar um dos melhores cafés de suas vidas.
Na despedida de beijo no rosto, perfumes se misturaram num bouquet de aromas arábicos.
Dali em diante, seus telefones tocaram e o namoro começou ainda naquela semana, pois a conversa no balcão, tinha se iniciado mais ou menos há uns seis meses e tinham pressa de tudo, como o cachorro que correu atrás do fusca.
Passaram a trocar torpedos apaixonados, e seguiam filosofando o cotidiano, até então monótono.
Escrevendo seus carinhos pelo celular numa manhã de maio, em direção ao trem, sem perceber o movimento, atravessou a rua no mesmo instante que surge o cão branco e preto, seguindo novamente o fusca. Numa manobra arriscada, o carro, para evitar o atropelamento, invadiu a calçada e raspou em cima do cachorro. Era como se o bicho num latido dolorido lhe dissesse: “menina vai com calma, mais devagar, é necessário ter cuidado e atenção com tudo nessa vida, pra quê tanta pressa?”. O bicho quase morreu, e para salvá-lo, chegou atrasada no trabalho.
Desde então, não enviou mais torpedos enquanto andava, e o namoro engrenou naturalmente.
Hoje está casada e o cãozinho anjo mora em sua casa, com rodinhas de apoio nas patinhas traseiras, devido ao acidente, e a tal borboleta azul tem aparecido de vez em quando na hora do café.
Viveram mais felizes tempos depois, quando a paixão virou amor de verdade, conferindo paciência, carinho e tolerância ao casal.
O trânsito continua o mesmo, os trens atrasam, a luz nem sempre é tão bonita pela cidade, para perceber que a graça do cotidiano é descortiná-lo.
Terminaram de tomar o café na primeira semana de janeiro.
Despediram-se, e ela ficou pensando em tudo que não viveram.
No balcão, ainda saboreava aquele restinho de café frio, que continua amargo, e se termina de teimosia. Distante, acorda ao ouvir a xícara que cai de seus dedos, estilhaçando.
-Desculpe! A moça disse ao atendente.
-Não foi nada, senhora. Vai te dar sorte, pois acaba de pousar uma borboleta azul no chão. Você viu?
-Eu gostaria de ver, mas eu só enxergo sombras.
Maira Garcia
Que fofo! Adorei! Seria um grande prazer tomar um café com borboletas na sua companhia, espero que um dia aconteça! Saudades... Bj
ResponderExcluirTem que acontecer logo, Lu! bjs
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