Você não é governo, não é país, não é lei, não é mundo. Você é alguém que faz parte de alguma coisa que não é você. Você é importante pra tudo que você não é. Por favor, não adoeça.

31 de outubro de 2019

Carrego uma bacia

da Guanabara

aqui em casa.

ela atravessou a Rio Santos

e chegou aos prantos

esvaziou

agora dorme tranquila na sala.

Escolhe o lugar pra morar,

nem sempre apropriado,

acontece com gente

e alguns pássaros.

Gosto de esticar o sábado

nas minhas pernas,

espreguiçar meus braços,

fazer pouco caso do relógio.

Gosto de dormir no sábado

fingindo que é sexta,

dormir domingo fingindo que é sábado.

28 de outubro de 2017

É na exaustão que descobrimos quem somos.

28 de outubro de 2020

Nem todo poema

quer ser vestido,
muitos querem se manter nus,

desinibidos.

A colcha que mexe sozinha.

A sandália que arrasta.

O boné que flutua.

Ali mora uma pessoa.

25 de outubro de 2017

Planta do mato

gosta de muro pintado.

26 de outubro de 2021

Flor de azaleia

teve a sorte de cair

bonita na haste

26 de outubro de 2021

Show do Milton Nascimento

é celebração

da música

em oração.

Ouvi falar,

que ele podia

ser um pai de santo

em seu palco terreiro.

Se isso é verdade,

ou não,

eu creio.

26 de outubro de 2021

se a chuva não dá trégua,

teto, colchão e reza.

corpos vivos pesam

porque a alma preenche

e quando se enlaçam

sentem

morrem como sempre

Dedos

de cor
salteado
no pé
chão quente
de flor
nem dá chulé.

27 de outubro de 2020

O nome dela

é o barulho

que as asas

fazem

no vôo.

Da próxima vez

que encontrar

uma borboleta,

tente ouvir a palavra:

Borboleta

27 de outubro de 2020

a vida,

uma frase deixada
pela metade.

A menina,

No livro

viu histórias como

a dela.

Viu-se.

Viu histórias tristes,

mas

Esqueceu-se

nas páginas

e prosseguiu

livre nos livros.

Sorriste?

22 de outubro de 2017

Uma hora você vai cansar de saber

que nuvens

são feitas de algodão,

que o céu é ladrilhado de azul,

que esta grama é um tapete,

mas não canse de ouvir

eu te amo.

Vi um pássaro pequeno

cor de azul petróleo.

Na cauda pinceladas

da cor da bandeira brasileira.

Canta feliz

porque não sabe

o que se passa

no seu país.

21 de outubro de 2020

Eu gosto de gente 

que na hora mais inusitada

lembra de uma poesia
manjada.

20 de outubro de 2017

Hoje é dia de quem é poeta. Criança eu era, como todas são, depois envergonhei, só voltei na maturidade, e me considerava antes de ter um livro, porque pra muita gente precisa existir este batismo. A poesia voltou num trem lotado, num celular simples, num grito silencioso que eu não sabia quem iria ouvir. Obrigada a você que lê, escrever poema passa pela leitura. Então hoje é mais dia de agradecer do que qualquer outra coisa.

 

Primeiro a palavra não veio,

foi o canto.

Porque o berro e o choro nascente

têm notas apreciadas

por almas delicadas.

 

Disfarçado

de luz elétrica

é Sol se assim quiser.

 

Pensei como seria

meu amor,

que não conheço.

Amor arranjado

pelo tempo.

Sorri como se o encontrasse.

Em algum lugar do mundo

vestia calça jeans

e camisa branca

com mocassim.

Não fazia frio.

O que sei sobre ele

é que hoje tivemos

o mesmo pôr do Sol.

E se tudo der certo,

teremos a mesma Lua.

Ele mora na Terra.

15 de outubro de 2019

Eu ainda

não cresci,
quando crescer
quero ser professora

e atriz.

15 de outubro de 2019

votem,

por você

e por outrem.

15 de outubro de 2018

 

Dentro do trem

paisagens humanas

toda semana.

às vezes a música chama

a poesia pra fazer música

mas a música esfria

e tem vez que a melodia

chega e pede letra,

e é trabalho diferente

tirar letra com o dente.

mas só com o convite a poesia fica feliz

e nem apressa coisa alguma,

porque ter música é parceria pra vida toda.

parceria não carece de pressa mas de prece. 

O amor que

obedece os intervalos
da canção:

Nem sempre amor.
Amor nem sempre.

13 de outubro de 2021

 

O que deu errado

foi tão certo

era longe

ficou tão perto

juntou o mar

com o deserto.

 

a baleia-branca

corre a costa

mar verde

fugindo da rede

sorrindo de peixe

que se sabe não é

pequena

corre

e some

na maré.

A solidão do poeta

não é diferente do leitor,
a diferença é que o poeta contou.

Dia do povo nordestino

A palavra nordestino

tem o norte

e o destino

lugar de gente que nasce

com uma vontade

que não cabe

é um povo tão grande que escapa

e enche de beleza o mapa do país.

O amor definha

por falta
de comida.

A realidade

é uma das provas

mais duras,

e é duro

de entrar

na cabeça.

A cabeça

tem que estar mole,

senão não entra.

8 de outubro de 2018

Exatamente como hoje,

mas longe.

 

Reza a lenda que um feitiço só pega se o coração de quem vai ser enfeitiçado estiver carregado de sentimentos impuros.

Reza a lenda que o medo é a incapacidade de ver alternativas seguras.

Reza a lenda que se não enxergar o outro em mim, eu estou sozinho.

Reza a lenda que ainda existe caminho.

Assinado:

Sua fada madrinha

6 de outubro de 2018

 O livro respira, quando a respiração fica parada por muito tempo começa a mofar. Pode reparar. A pulsação acontece com um simples toque dos dedos. Ao deixar de ser lido costuma ficar perdido num canto qualquer de um cômodo. Sem ninguém tocar suas páginas, o livro fica estático e começa a definhar, então a traça toma a liberdade de comê-lo. Comida de insetos, ele que alimentava cérebros ao ser encontrado é destinado para reciclagem. Não se sabe o que virá a ser, se recheio de compensado de móvel, papel higiênico ou caixa de ovos. É certo que não terá mais palavras, e as mãos que tocarem os objetos não lhe farão mais livro. Livrai-o do mal, antes de mofar, doe para alguém!

5 de outubro de 2017

Olhei pro homem que estava parado

em frente ao bar.

Olhou pra mim.

Deu pra ver que esperava

pela água do chão.

A água suja da limpeza.

O homem tinha os pés magros,

cabelos brancos, desfiados pelo altura

do

ombro.

Terno amassado.

A água passava por ele,

entre os dedos,

no meio da pele branca puída

Na Paulista eu vi o homem

e seus olhos de criança.

4 de outubro de 2019

Das urgências que tomam o dia,

a literatura
é a profilaxia.

4 de outubro de 2018

Na São Bento

tinha um homem distribuindo santinhos

na garoa.

Falou um nome com

a voz muito viva,

e ao passar por ele

mantive a feição indiferente,

mas caminhou comigo, mesmo parado no meio

da rua, e nos distanciando, continuou comigo,

mesmo tendo falado

um nome que eu não votaria,

continuou comigo,

agora com a voz rouca

e cansada,

continuou comigo,

com minha tristeza

mal acostumada com histórias

que têm

um final feliz,

continuou comigo

na lágrima

que se misturou à chuva,

ele continuou comigo graças à democracia. 

4 de outubro de 2018

 

Tem livro

Tem livro de doação que abandonado só quer olhos e mãos. Tem livro na livraria que de tão ansioso cai no pé de um leitor, eu já vi. Tem livro que a capa pula na sacola. Tem livro que tem a sorte de ser premiado, um conjunto de pessoas o escolheu e sua vida nunca mais será a mesma. Tem livro que mesmo sem querer foi parar na reciclagem. Tem livro que causa alergia porque ficou mofado mas tem gente que lê mesmo assim: são os literoimunes. Tem livro que é tão querido que vira bestseller. Tem livro que nunca vai ser lido, são livros enfeite. Dizem que são os mais tristes do mundo. Tem livro que não é de papel, nem digital, é feito de sonho. Tem livro que é roubado e mesmo assim faz alguém feliz. Tem livro que é perdido, e não sabe como voltar pra casa. Tem livro que não é de ninguém, tem relacionamento aberto. Tem livro que o título é spoiler. Tem livro que o título é uma armadilha. Tem título que é lisérgico. Tem livro que ainda está pra nascer. Tem livro que só falta falar e tem livro que fala. Tem livro que ninguém esquece. Tem livro complexado porque ninguém o quer. Tem livro que só quer ser lido e isto não basta para ser livro, então vai fazer análise. Fica deitado no divã.

Escrito em 3 de outubro de 2019

Preciso escrever uns poemas novos,

vou ouvir Caetano por uns dias,

depois eu volto.

Esperar o que a pessoa

pode lhe dar,

Nem mais,

nem menos.

Evita sofrimento.

2 de outubro de 2019

Pra mastigar direito é preciso peixe com espinhos.