segunda-feira, 31 de março de 2014

A desculpa da gripe


A gripe usa a mudança de tempo,
pra jogar a culpa no tempo.
A culpa, que não tem tempo,
diz que a gripe é pegadora e ponto.
A sala escura do cinema,
para esquecer do lugar onde você está.
O teatro que respira, para quem quer se encontrar.
Indireta chama o Face no chat:
-Quando vai ter aplicativo comigo?
Tá meio mundo me usando, e eu não ganho nada com isso!
As pálpebras se beijam com vontade para ver se você dorme.

sábado, 29 de março de 2014

Mastruz

Espremeu a dô,
mas trouxe a flô 
desfeita 
em benzedura
na receita.

O camarote

Pontualmente às quatro horas de toda tarde, Lizete descia a rua para comprar pão. O cabelo indevidamente preso, engomado, num coque sem adereço, uniforme ajustado, postura altiva, não fosse o uniforme, era a patroa que seguia. Abria o portão, com as mãos em cata-vento, pernas torneadas de samba, Lizete passista da Mocidade do seu bairro, era a visão do Paraíso.
O maior fã destes predicados, Sebastião de olhos recém chegados do Pará, não perdia tempo para ver a Lizete passar. De camarote, na portaria, a alegria com hora marcada do dia. Para chamar atenção da musa, observava se não havia morador para ouvir aquilo, escolhia uma música do Amado Batista, que podia ser ouvida na calçada. Lizete que não gostava do Amado, mas ouvira na calçada do Ipiranga todas as faixas, demorou para olhar de lado, quando parou para ouvir, Sebastião ficou paralisado. O síndico que ouviu, não achando engraçado,
falou ao interfone:
- Porteiro que não pode ver mulher, vai ficar desempregado!


Esta que transcende é viva,
deixou de ser estática, 
pulsa.


 Arte.
O bebê mudou de casa,
a casa ficou muda.
O que eu vi meus ouvidos não esquecem.
Toda vez que um ser virtual ganha corpo, 
corre na rua procurando a primeira pessoa para receber um abraço bem gostoso.
Eu vi um rapaz de sorriso tão largo, 
que pra passar por ele pediam licença para ficar ao seu lado.

O livro e o escolhido

Desconhecidos no trem: 
-Que livro você lê aí? 
-A canção eterna 2, te empresto o vol 1! 

Vê como o livro escolhe as pessoas?

Bobagem na bagagem

Carrego na bagagem algumas bobagens. 
Desfaço a mala, quando ficam sérias, 
hora que as bobagens estão voltando de férias.

quinta-feira, 27 de março de 2014

O decote

O agente de turismo para uma mulher, que distraída com os braços, tenta ouvir orientações sobre o Brasil, ao confirmar sua hospedagem:
- Lá é um lugar realmente especial. 
Colocando o copo da água na mesa para servi-la. Ela bebe um pouco de água, e arruma o decote da blusa enquanto tenta uma posição confortável na cadeira, ele retoma:
-Você pode usar a roupa que quiser, mas aqueles biquínis famosos e algumas peças de vestuário são aceitas apenas na praia e nas escolas de samba!
-Isso eu já sabia e me conforta muito! Ela toma um pouco mais de água,
respira, ajeita o decote para o lado esquerdo do peito.
-Não se esqueça de um detalhe importante. Lá, esteja você com a roupa que quiser, precisando amamentar seu filho, tenha sempre um pano para cobrir-se.
A mulher engasga com o último gole de água.

Desfolhadas, para Adélia Prado

Humildes as palavras 
que esperam
os olhos e a boca se abrirem, 
e mãos e ouvidos para serem tocadas.

Onde ele foi parar?

No alto do prédio do Banespa:
- São Paulo, quando você quer a cidade fica bem pequena, 
faz eu reencontrar meu argentino?

A razão sem razão

Estar sempre com a razão atrapalha relacionamentos, 
pois não raro, quem aparece constantemente ao seu lado,
namora com a solidão.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Sonhando com a paz

Hoje um conflito desse mundo acordou aflito, 
pois sabe que a guerra chegando ao fim, 
perderá seu benefício.
Sentir é muito seu, saber o sentir é nosso.

Outonada

Outonada.
O tempo escreve em folhas da calçada. 
Vai que esfria. 
Vai que eu chego. 
Se agasalha, vai?

Importante dizer que

Na ofensa, vem sempre uma legenda avessa, 
que mesmo que não cause dor, lhe diz: 

- Você é importante pra mim.

Principia

Desde o rascunho, a arte é tudo. 
Até a cópia da obra de arte, 
que vendo a si mesma,
enxerga, 
sem a venda, 
a homenagem.
As posturas de vida são os primeiros asanas sagrados,
 depois vieram os criados. A postura de vida favorece nossos atos.

segunda-feira, 24 de março de 2014

A cama espera pelo sono como o cão espera pelo dono.
Adélia Prado e seu casaco preto,
vestido chamuscado de branco.
No meio da roda,
gira um tanto.
Adélia carrega esperanto.

Dolores das Dores

Dolores sofria, 
tomava como suas dores, 
sem saber se podia. 
E no dia que a sua, 
disse que existia, 
no susto veio a cura.

domingo, 23 de março de 2014

A veia azul do lado de cá

Tenho um olho que na face
a veia azul prevalece.
Desse lado direito não há disfarce,
enquanto o esquerdo,
que melhor leio
nada aparece.

Assim a juventude e a velhice
em mim conversam.
Enquanto entram em acordo,
Eu me acostumo com o Universo.



Avó para neta




-É claro que importava se não me abriam a porta!
E por saber que seria assim até o fim,
que eu não desisti de abrir.

sexta-feira, 21 de março de 2014

Quando as palavras me feriram fui buscá-las no olhos de um mendigo, que juntava folhas que encontrava em textos aparentemente sem sentido. Não soube me responder seu nome, mas disse que eu e ele, e todo mundo some. Que sua saudade de não sei de que enorme, não tem sobrenome, que as palavras ajudam a saber que ele é um homem, que sentindo fome, não tendo o que comer lê no papel o nome da comida, e sentindo fome de mulher come uma folha de revista.

Quando era início

Desde muito,
quando tudo era início
que as palavras brigam.
O alfabeto inteiro,
se batia palavra, gritava:
-Deixa disso!

Quem é sabido ouve até o dito por não dito.

A soma

Quanto mais me esqueço no outro,
mais me reconheço,
pois somos somas de recomeços.

com a multidão 
vou até o
horizonte

Começamos o trajeto,

não sabemos ainda onde.

quinta-feira, 20 de março de 2014

A solidão não tem papel

A solidariedade não tem solidão,
aparece mais fácil
onde o que separa
não é o papel, é o papelão.
As palavras tem poder, experimente usar um "por quê?''.
O perdão das ofensas
se declara com o mesmo cuidado que se declara um amor,
que uma das partes nem sempre está preparada.

Com que se ocupa a dor

A paz apavora quem se pré-ocupou com a dor.
Como preencher esta que se foi?

A resposta terapêutica pode romper o ciclo.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Caminheiro

E então a estória veio.
Querê-la para si é querela.
Quem vem primeiro,
se somos apenas meio.
Se escrever é caminheiro.

Água de correr

As crianças param a brincadeira,
a correria e não se importam,
onde estiverem, pedem,
água de torneira.

terça-feira, 18 de março de 2014

Silenciar também é ter o que dizer.

Dona Justina

Dona Justina, era sabido no bairro que daria trabalho com o tempo.
O confessionário da rua, a Padaria da esquina, tudo se sabia no atendimento.
Quando pegava o pão desabafava, tinha empregada e motorista,
mas queria passear com a bengala e ia.
A Tereza, a empregada há mais de 10 anos da casa, morava no extremo
da zona leste da cidade e pediu para dormir no trabalho, que
era na ala nobre da zona sul. Dona Justina desconfiada das ideias e
sob influência da parentela, chamou para conversa,
que morar ali não daria. E Tereza foi embora, pela frieza que não entendia. 

O atendente da padaria, Seu Clemente, que tudo sabia, 
lamentou seu desatino.
A empregada, que era mais do que sua servente, 

e muito lhe estimava a companhia, temia pela patroa. 
Poucos dias após a dispensa da Tereza, a despensa
foi esvaziada, a cortina cerrada e a casa fechada.

Dona Justina foi morar num condomínio fechado,
muito bem localizado, longe da padaria, 

onde a vizinhança comentava a ausência de Dona Justina
que agora morava sozinha num asilo.


segunda-feira, 17 de março de 2014

Tocando Elis

Conheci Elis girando numa vitrola,
mal comecei a ouvir, 
comecei a chorar,
não sabia nem o que era 
sofrer por
amor,
mas entendi ali.

sábado, 15 de março de 2014

Todo artista que tem um grande público, sem hipocrisia nenhuma, sabe o alcance que tem. Alguns são tão bacanas que ao invés de quererem virar estrelas, as alcançam com seus gestos e vida. Observe que alguns artistas, por ironia da profissão, não tem vida própria, outros tocam vidas. Foi assim com Paulo Goulart.

Quem é?

A menina parece que ia pela primeira vez com a mãe num banheiro público, ao entrar uma mulher, perguntou: 
-Quem é?
Quem entrou fez o que precisava fazer e ficou em silêncio ouvindo a conversa das duas.
-Não pode ficar querendo espiar por debaixo da porta quem entra no banheiro, nem conversar, filha!
A menina aproveitou a distração da mãe e tornou a espiar, e em frente da pia viu uma saia jeans e um tênis colorido e ficou intrigada.
Viu o tênis sair em direção da porta e ouviu:
- Tchau menina! E ela responde rindo, junto ao silêncio da mãe:
- Tchau! E a voz da mulher que saía emendou:
- Obedeça sua mãe!
Na volta para casa a menina ficou pensativa, a mãe observando. Quando a porta da casa se abriu, correu em direção ao quarto, tirou o sapato, subiu na cama para alcançar a estante das bonecas, procurou a preferida, olhou séria e interrogou:
- Mocinha, bonito, heim? Eu me lembro de ter te deixado de castigo no armário, e você aproveita pra sair com minha saia e meu tênis por aí? E outra, se você não me obedece, que estória é essa de pedir para obedecer minha mãe? Vai voltar pro armário já!
Avise um amigo que corre um perigo,
Se o amigo não correr com você,
não existe perigo.

sexta-feira, 14 de março de 2014

fio

Confiar é puxar um fio num quarto escuro.
Na claridade, aparece um rasgo,
ou um cerzido que resolve tudo.

Transe

Luzes brancas fingem que estão indo,
Luzes vermelhas fingem que estão voltando.
O transe do trânsito.

Chuva paulisteira

A avenida Paulista é corrida,
ao chover nas paralelas vão corredeiras.

São as pessoas que me trazem o poema do dia, chegam frescas, ventiladas como a brisa perfumada da primeira hora da feira. Param na minha frente, mudam de cor, falam do amor e da dor. Sempre me perguntam, Maira, você está com alguém? Eu não minto, pois podem ser vistas dentro dos meus olhos, então digo que sim, pois sou apaixonada por elas, das tantas vezes que as escrevo aqui e ali.
Um sentido contaminado,
se nega a ler veemente
um simples enunciado.

A paz quiçá dormente,
espera pelo crente.

Enquanto o sofrimento
espera a cura do viciado, 
que sofre e entende 
que sentir o certo é o errado.

quinta-feira, 13 de março de 2014

o amor me diz muito 
sinto muito
o amor que sinto
muito

Na gangorra dos pequenos

Na gangorra do parque dos pequenos, 
brinca quem tem o mesmo peso. 
Quando o peso não combina, 
vira e mexe acontece uma briga.

Na medida

Na medida que se dá 
alta importância, 
na inconstância se dilui, 
a restar o valor real, 
sem especulação, 
de modo algum.

Todo ouvidos

Na condução, a paquera tem diminuído,
estão todo ouvidos, 
apertando seu comprimido.

quarta-feira, 12 de março de 2014

A via

Via as escurecidas do céu ressentidas,
 chuva cansada na despedida, 
ao longe se via a via, 
no riso conciso a rua do Sol.

terça-feira, 11 de março de 2014

Pedro, pedrinho.

Pedrinho dizia sempre, o amor é para sempre. 
No primeiro amor acabado, Pedro sorriu, olhou de lado:
 -Foi só um romance.

Dedução

Dedução é a técnica mais utilizada no mercado para criar saias justas e calças curtas.

segunda-feira, 10 de março de 2014

Cair no esquecimento

Um pensamento muito apressado pegou carona no vento,
mas o vento parou para descansar.
E tão rápido falou o vento que o pensamento
caiu ali mesmo.

domingo, 9 de março de 2014

A Gênese na mesa

Quase na hora de apagar velinhas, a sala estava cheia, e a criançada gritava o parabéns o mais rápido possível, pois queriam atacar o bolo e o brigadeiro que dançavam pra cair na mesa, mas Samuel, fazedor de sete anos, pediu para falar o tal discurso assim que terminaram de cantar:
- Foi Deus quem disse viva, quando a vida nasceu. Quem quer bolo?

Três pontos

Entender o que nós dizem ou escrevem, depende de três pontos:
a ausência do ponto, o ponto de vista e a vista no ponto.

sexta-feira, 7 de março de 2014

Lugar de ser mulherado

O mundo ainda não foi mulherado de tudo. 
E mundo esquece e comemora, 
e ao lembrar-se de como ainda fazem, também chora.

Molde

Fiz vestido
com os pontos
finais dos caminhos. 
Os sinais
nos brocados dos sapatos, 
as vírgulas 
reservei como brincos.
Era uma Terra como essa,
cheia de adversidade,
com um céu azul no céu,
um pouco mais cheia de maldade.
Eis que chega o dia,
de uma grande novidade,
ia chegar até aqui,
uma nova amizade.
Para atravessar o firmamento,
algo se modificou,
fizeram uma arte no vento,
e ele finalmente pousou.
Um menino para os outros estranho,
e precoce na idade,
via coisas que quase ninguém via,
e as dizia com propriedade.
Carpinteiro como o pai,
e pescador na caridade,
os iguais seguiam seus versos,
a respirar com liberdade.
Passou a ser seguido,
pelos seus gestos e milagres,
curava quem estava perto,
e mandava embora a saudade.
Sangue nobre ele não tinha,
mas sabe a tal curiosidade?
Queriam saber de onde ele vinha.
e o porquê de tanta bondade.
Ao tirar a venda dos olhos,
num horizonte cheio de amor,
alguns homens de poder e ódio
agiram com furor.
Conhecedor das leis vigentes
da Terra,
e como andava a sociedade,
entendeu o que lhe fizeram,
e pediu ao pai piedade.
Os irmãos que assim o levaram,
se arrependeram mais tarde,
voltaram outras vezes na mesma Terra,
pra reformar a moralidade.
Ninguém disse que a missão seria fácil,
ainda estudamos a essência da vida,
ele nos ensinou a fazer o resgate,
e isso acontece todo dia.
Era uma Terra como essa,
cheia de adversidade.
O céu permanece azul no céu,
e conhecemos a bondade.
Onde um ou mais estiverem,
temos a certeza,
não importa quem seja,
um dia a luz sempre chega.

quinta-feira, 6 de março de 2014

quarta-feira, 5 de março de 2014

de olhos fechados
 ficou o beijo
 enamorado de medo

Desaguando

-Lá vem a chuva, e lamenta a molhaceira. 
O guarda-chuva constrangido arrebenta:
 -Sem capa e galocha? Quero que se molhe!
A cidade estava vazia, iam cheias as piteiras de aço e corações nas ribanceiras. Convence que pra chegar naquela calçada, algo de tristeza puxava pelas abas, a feliz-cidade dando asas com aspirador poluído, sem pedir licença. O ar de ferro queimado cercava com urina de gato castrado toda a área dos adictos. 
-Tem um real senhora, que a minha realidade não me aguenta, me dá um dinheiro aí, que eu quero morrer no carnaval, a senhora deixa? 
Sábado faltou luz na Rua Casper Libero.

terça-feira, 4 de março de 2014

O casório do samba e o carnaval, 
tão certo pela volta
 chega ao fim. 
Ralentando
 soluça a cuíca, 
o reco-reco e o tamborim.

domingo, 2 de março de 2014

A sala de espera dela

A felicidade não pode chegar toda hora,
 felicidade se atrasa de propósito. 
Enquanto ela não chega às vezes
 aparece a tristeza, a quietude, 
e a saudade para fazer aquele charme. 
Quem mais ganha com a falta da felicidade
 é o tempo, que vive de estender os prazos
 e se assenhorar de tudo a seu contento. 
O duro é aguentar a contrariedade
 conversando com a ansiedade
 enquanto a felicidade não chega.

A Rua 25

A Rua 25 é março e fevereiro e março todo dia,
que nasce fantasia
 e morre nua toda noite
 feito quarta-feira de cinzas.

sábado, 1 de março de 2014